Pastelosamente arrumava o seu quarto, decisão tomada a muito esforço... há meses que se obrigava a pensar que precisava de arrumar as gavetas, de arejar os armários, doar os vestidos que nunca mais vestira (ou os que nunca chegou a usar...), a encontrar os pares das centenas de meias que tinha desemparelhadas... Esta tarefa exigia-lhe um dispêndio de energia, que nem sempre tinha saldo disponível para tal! Mas necessitava neste momento... não podia adiar mais! Mas que raio, que dificuldade pode ter encontrar umas meias debaixo da cama, ensacar uns vestidinhos, que já gostara mas que agora sempre que abria o armário lhe dava uma leve sensação de nausea...?! Ainda não descobrira se lhe era causada pela ausência de estética ou pelo odor a mofo que lhe invadia as narinas... Enquanto dolorosamente abria e fechava as gavetas, deitava fora os recibos das últimas dezenas de pringles que comprara, encontrou uma pequena (?!) caixa de madeira dentro de uma mala castanha de viagem... quando fora a última vez que a vira? quando fora que tinha decidido coloca-la ali?! Um lugar seguro... longe da vista, longe do coração?! Já fora bem mais pequena... mas há muito que não aumentava de tamanho! pegou-lhe com cuidado, com a mesma precaução com que se toca em algo que não conhecemos... mas ela conhecia aquela caixa muito bem! Mas tinha medo que ao abri-la voltasse tudo de novo! Abriu-a... ficou a olhar para o brilho metalico de uns, vitreo de outros, para a rugosidade da madeira, para o craquelée da loiça... tocou-os um a um, rodando-os suavemente entre os seus dedos, cheirou-os... tanto de si naqueles dedais! Cada um deles representava uma viagem, um amor, uma desilusão, uma alegria, um almoço a menos, uns copos a mais... todos eles tinham história... pedaços da sua vida dentro daquela caixa, que ela decidira esconder dentro de uma mala de viagem de pele castanha! Escondera estes dedais, que em tempos comprara sempre que queria guardar de forma palpável o que estava a viver... ainda conseguia recordar o que cada um significava para ela... alguns ainda lhe traziam dor... na altura tinham-lhe dado alegria! outros já só conseguia esboçar um sorriso de ternura, ou de... idiotice porque chorei tanto?!
porque a escondera?! há momentos em que pensamos que longe da vista longe do coração... e sempre lhe disseram que não se deve ficar presa ao passado! Deixara de comprar dedais! decide agora voltar a comprar dedais... não muda nada, mas podem ser belas peças de arte!
E assim, mais uma vez, não acabou de arrumar o quarto... deixou-se ficar pastelosamente a olhar para os dedais, dentro de uma caixa de madeira, em cima da mesa de cabeceira, a imaginar como serão os proximos que comprará. Se calhar é melhor comprar uma caixa de madeira maior...
sábado, junho 11, 2005
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4 comentários:
Camilinha: obrigado pela visita... gosto que tenhas apreciado!
Até nos faz pensar que estas “memorias” são criadas propositadamente para que não acabemos de arrumar o quarto… :P
Mulheres eh eh
Tekus: Difamador... aquela caixa de dedais ja teve mais longe de possuir um em forma de mama esquerda com 2 belessimos pontos castanhos! ;P
Homens grrr...
espelho: a beleza está nos olhos de quem vê (a modestia fica-me tão bem...) Obrigado!
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